É fácil recordarmos as histórias que nos inspiraram, ficcionais ou não. No trabalho, no entanto, não é tão frequente lembrarmos das experiências de mudança que nos foram vendidas com narrativas envolventes e que nos capturaram pelo coração. Boas narrativas são a essência de boas histórias e elas têm o poder de inspirar e engajar.
Neste post, gostaria de convidá-lo a refletir sobre três aspectos de boas histórias que te ajudarão a construir narrativas bem sucedidas para convencer e engajar pessoas nos processos de mudança promovidos por você.
Gatilhos emocionais:
Lembro da minha reação emocional quando li o livro “Ensaio sobre a Cegueira” de José Saramago. A narrativa foi tão bem escrita que desenvolvi um sentimento repugnante contra o vilão que oprimia as mulheres na história. Boas histórias nos atingem emocionalmente e elas parecem ter o poder de alimentar sonhos pessoais, nos deixar com raiva ou nos fazer sentir identificação com os personagens da história.
“A Narrativa Pública é mais do que apenas contar histórias. Trata-se de contar histórias que importam. Histórias que envolvem o coração. Desenvolvemos nossos valores através das experiências de nossas emoções e nossas emoções nos dizem o que fazer.” Marshal Ganz em The Art of Change Making
Para inspirar e engajar as pessoas em direção a um propósito comum, é importante rever cuidadosamente as narrativas que construímos para contar a história dos processos de mudança. Se elas forem muito cerebrais, nós não iremos atingir os corações e almas. Nossas narrativas soarão como palavras frias e incapazes de atrair a atenção e o interesse das pessoas. Lembre-se de que evidências raramente viralizam.
Ponto de inflexão:
“Observe o que move uma história. É mudança, conflito, tensão, descontinuidade. O que nos prende em um filme ou romance é o ponto de virada, o rompimento com o passado, o fato de que o mundo mudou de alguma forma intrigante e fascinante e forçará o protagonista a descobrir e revelar quem ele realmente é. ” Herminia Ibarra e Kent Lineback
Um processo de mudança é normalmente mal vendido nos ambientes de trabalho porque as narrativas criadas para vender a experiência de mudança não têm um ponto de virada claro. Numa tentativa de fazer com que os processos funcionem sem sobressaltos, os agentes de mudança deixam de mostrar quando é o exato momento de transformação da história.
Uma mudança pode ser para melhor, pois novos caminhos trazem novas possibilidades, no entanto, na falta de um ponto de virada, o processo de mudança é percebido como uma ameaça perigosa que vem com resultados imprevisíveis. Se estamos construindo uma narrativa para vender um processo de mudança, é importante que ela tenha indicações claras sobre o momento exato da virada.
Coerência
“Todas as boas histórias têm uma característica tão básica e necessária que muitas vezes é assumida como garantida. Essa qualidade é a coerência …” Herminia Ibarra e Kent Lineback
Uma boa narrativa de mudança precisa ajudar as pessoas a conectar a base de sustentação construída no passado com a visão que estamos vendendo para o futuro. Com uma indicação clara de onde a trajetória está nos levando, será mais fácil engajar pessoas com o projeto no momento presente para tornar reais as aspirações de futuro.
“Entendi agora qual é a verdadeira arte de escrever cartas, como sempre nos disseram, é expressar no papel exatamente o que alguém diria à outra pessoa em uma conversa presencial …” Jane Austen
Cartas já foram no passado, instrumentos populares para se contar histórias. Hoje já não escrevemos muitas cartas mas continuamos a contar histórias em nossas experiências profissionais e pessoais, por isso é essencial construir narrativas relacionais e vívidas capazes de inspirar, engajar e promover a colaboração. Vale a pena investir na narrativa, pois obteremos melhores resultados contando histórias que movem as pessoas pelo coração.
1. Systems Leadership Steering Group, 2015, The Art of Change Making, ISBN 978-0-9931400-9-9, The Leadership Centre
2.Ibarra, H, Lineback, K, January 2005, What’s Your Story, Harvard Business Review, Managing Yourself, Harvard Business School Publishing corporation
Photo credit: Eduardo López López on VisualHunt.com / CC BY-SA